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Nos últimos anos, o tema do compliance empresarial tem ganhado cada vez mais atenção. Paralelamente, também tem aumentado a popularidade e a relevância da sustentabilidade corporativa – sobretudo em sua abordagem ESG. A questão é que compliance e sustentabilidade estão intimamente relacionados.
Exemplo claro disso encontra-se na 5ª Pesquisa Maturidade do Compliance no Brasil, realizada pela consultoria KPMG, que em sua introdução já faz referência à relação entre compliance e ESG, além de reforçar que, para 75% dos executivos seniores, “a governança e a cultura de compliance são essenciais para o sucesso da estratégia da empresa”.
Para entender melhor o que é compliance e como aplicá-lo, e conferir qual é a relação entre compliance e sustentabilidade, incluindo um bom exemplo, acompanhe:
O que é compliance
Com origem no verbo em inglês “to comply”, o termo compliance significa estar em conformidade, obedecer, concordar, cumprir com. Trata-se especificamente de agir em conformidade com as leis, normativas, padrões éticos, regulamentos internos e externos.
No âmbito empresarial, a aplicação do compliance refere-se, portanto, ao cumprimento de leis, normas, regras, protocolos e políticas, sejam internos ou externos.
Para ser considerada uma organização “em compliance”, a empresa deve, então, cumprir com suas obrigações legais (sejam trabalhistas, financeiras, previdenciárias ou referentes a normas específicas do seu setor de atuação) e estar em conformidade também com as políticas e protocolos internos estabelecidos (como códigos de conduta, políticas de gestão de riscos, etc.).
Na opinião de Alessandro De Laria, agente de Controles Internos do Sicoob SC/RS -, “podemos classificar as seguintes políticas como sendo essenciais para uma boa checagem, monitoramento e reporte de compliance:
- Política Institucional de Controles Internos e Conformidade
- Política Institucional de Gestão de Continuidade de Negócios
- Política Institucional de Prevenção à Lavagem de Dinheiro e ao Financiamento
- Política Institucional de Prevenção e Combate a Fraudes
- Política Institucional de Risco Operacional”.
Tipos de compliance
Para esclarecer melhor como se dá a aplicação do compliance empresarial, podemos fazer uma divisão teórica do programa de compliance, dividindo-o em alguns tipos principais:
- Compliance ético
Referente às normas que visam garantir a integridade de atuação da empresa, incluindo políticas anticorrupção, antifraude, antissuborno, antiassédio, antidiscriminação, assim como relacionadas à transparência e outras boas práticas.
- Compliance tributário
Conjunto de regras internas com o objetivo de garantir que a empresa cumpra com a legislação tributária vigente, englobando tanto as obrigações tributárias principais (pagamento de impostos), quanto as acessórias (relatórios detalhados de atividades).
- Compliance fiscal
Diretamente relacionado ao compliance tributário, o compliance fiscal trata de adequar a empresa às normas fiscais, incluindo toda a escrituração fiscal e a inserção de dados no sistema de gestão.
- Compliance trabalhista
Conjunto de regras referente às obrigações trabalhistas da empresa, do recrutamento à eventual demissão. Também pode incluir normas para cumprimento do plano de cargos e salários, assim como de acordos coletivos, além de abranger temas como: segurança do trabalho, diversidade e inclusão, promoção e integração, entre outros.
- Compliance socioambiental
É a modalidade em que compliance e sustentabilidade parecem estar mais diretamente relacionados (ainda que não seja a única). Trata das normas e políticas que visam cumprir com as regras ambientais, de responsabilidade socioambiental e de valorização da comunidade local.
- Gestão de riscos
Pode ser visto como um tipo de compliance ou como um nível de aplicação do compliance. De toda forma, trata-se de um processo de identificação, avaliação, mitigação e monitoramento dos riscos que podem ameaçar a prosperidade do negócio e dos riscos que o negócio pode representar para terceiros (ex.: riscos ambientais).
- Gestão de processos e negócios
Assim como a gestão de riscos, também pode ser entendida como um nível de aplicação do compliance, tratando de que todos os procesos e ações de cada colaborador (incluindo gestores) esteja em conformidade com a cultura de compliance, incluindo todas as regras anteriormente mencionadas e outras possivelmente aplicáveis de acordo com cada empresa.
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Aplicação do compliance
Para aplicar de forma eficaz o compliance empresarial, é importante perceber que não basta apenas estabelecer normas a serem seguidas. Tampouco trata-se somente de criar um departamento dedicado a isso.
A cultura de compliance envolve todo um processo de avaliação e monitoramento contínuo que deve ser observado e seguido por todos os integrantes da empresa.
Para uma efetiva implementação dessa ideia, confira alguns pilares:
- Governança
O comprometimento da alta direção é fundamental para a implementação de uma cultura de compliance empresarial. Os gestores devem envolver-se na elaboração de normas e políticas e comprometer-se com o seu cumprimento, estimulando a adesão dos demais membros.
- Métodos de avaliação de riscos
Além de estabelecer normas, é importante também definir como será avaliada a aplicação dessas regras, incluindo métodos que permitam prever possíveis riscos.
- Implantação de política de compliance e códigos de conduta
A criação de um ou mais documentos formais abordando todas as regras e políticas adotadas pela empresa é um passo importante, assim como a divulgação desse(s) documento(s) interna e até externamente (para fornecedores, parceiros e consumidores, por exemplo).
- Comunicação e treinamento
Para que a aplicação do compliance seja efetiva, é primordial que todos os colaboradores da empresa, em todos os níveis, sejam informados sobre as normas e políticas a serem seguidas. E para transformar essas informações em uma verdadeira cultura organizacional, é importante contar com treinamentos periódicos, garantindo a adaptação de todos e o aprimoramento do programa de compliance ao longo do tempo.
- Controle interno
Um ponto fundamental do processo de aplicação do compliance é acompanhar a rotina da empresa, mantendo o controle dos processos perante as obrigações externas e internas. Nesse sentido, além de sistemas informatizados de controle para a coleta e o processamento de informações das diversas áreas, também pode ser útil contar com canais de denúncia, abertos a colaboradores e demais stakeholders que, eventualmente, identifiquem desvios ao compliance.
- Auditoria e monioramento
Por meio de monitoramentos contínuos (que podem ser feitos por meio de auditorias, sistemas informatizados de controle, denúncias, questionários de autoavaliação, etc.) é possível avaliar constantemente a conformidade dos processos e negócios da empresa em relação às leis, regras e políticas externas e internas. A investigação de eventuais inconformidades, a detecção e combate às irregularidades são parte desse controle.
Compliance e sustentabilidade
Agora que você já entendeu melhor o que é o compliance empresarial e como ele pode ser aplicado, fica muito mais fácil compreender a profunda relação existente entre compliance e sustentabilidade.
Como você já deve ter percebido, compliance e sustentabilidade compartilham muitas premissas fundamentais, entre elas:
- o comportamento ético, a atuação anticorrupção, antifraude, antissuborno e a transparência (que fazem parte da governança sustentável);
- as políticas de diversidade e inclusão, antiassédio e antidiscriminação, a correta aplicação das regras trabalhistas, o estímulo aos treinamentos empresariais e à responsabilidade social (que integram a sustentabilidade social);
- o cumprimento das regras ambientais, a gestão de riscos ambientais e o próprio compliance socioambiental (que se relacionam à vertente ambiental da sustentabilidade).
Se analisamos, portanto, a sustentabilidade mediante sua abordagem ESG (ambiental, social e governança; em tradução ao português), percebemos de forma ainda mais clara as grandes coincidências que existem entre compliance e sustentabilidade.
Podemos dizer, inclusive, que para que uma empresa seja realmente sustentável (considerando todas as vertentes desse conceito), é indispensável estar em conformidade (em compliance) com as leis e regulamentações externas, com padrões éticos de atuação e com normas internas que levem em consideração os critérios ESG.
Além disso, reconhecendo essa íntima relação entre compliance e sustentabilidade, a consultoria KPMG afirma, na pesquisa anteriormente mencionada, que “as rotinas, ferramentas e metodologias utilizadas nos programas de compliance podem e devem auxiliar na construção de práticas de ESG mais efetivas”.
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Um bom exemplo
O agente de Controles Internos do Sicoob Central SC/RS, Alessandro De Laria, reconhece que existe uma relação direta entre compliance e sustentabilidade.
No caso de uma instituição financeira como o Sicoob, a existência de normas como a Agenda ESG do Banco Central só vem a reforçar essa relação.
Nesse contexto, Alessandro conta que a Central realiza o trabalho de conformidade por meio de diversos recursos, como a Gerência de Supervisão, a Gerência de Riscos e a equipe de Controles Internos e Conformidade.
Além disso, são realizadas diversas auditorias (internas, externas, cooperativas e especiais) para o monitoramento do programa de conformidade e também há uma ferramenta voltada à autoavaliação quanto à conformidade das atividades segundo normas e resoluções, o CSA.
Alessandro comenta ainda que “por estarmos inseridos em um sistema, muitas diretrizes são estabelecidas no CCS”, o Centro Cooperativo Sicoob.
Nesse sentido, é válido observar os esclarecimentos trazidos pelo Relatório de Sustentabilidade do Sicoob nacional, segundo o qual:
“O fortalecimento das boas práticas e o aprimoramento contínuo da governança no Sicoob é assunto diretamente ligado à Alta Administração e envolve todos os níveis: o Centro Cooperativo Sicoob (CCS), que congrega todas as entidades de 3º nível; as cooperativas centrais, ou as cooperativas de 2º nível; e as cooperativas singulares, ou as cooperativas de 1º nível.
Em conjunto, sob a coordenação do CCS, são definidos instrumentos, políticas, normas, procedimentos, mecanismos de controle e um conjunto de medidas sistêmicas que visam prevenir, detectar e corrigir desvios e outros fatores de risco associados ao negócio que, consequentemente, poderiam afetar as partes interessadas”.
Cabe observar ainda que, por tratar-se de um sistema cooperativista (um modelo de negócios com princípios mais justos e humanos), o Sicoob tem na sustentabilidade um dos seus principais pilares, o que leva a instituição a valorizar ainda mais a aplicação do compliance empresarial.